Rebel Moon – Part Two: The Scargiver

Antes da sua estreia em Dezembro do ano transacto, havia em torno de Rebel Moon, o mais recente filme do polarizante Zack Snyder, uma forte expectativa, muito alimentada pelos críticos das mais recentes tendências de Hollywood, de que a obra de Snyder seria a resposta perfeita à Disney, que tem sido o principal foco desses mesmos críticos e que é responsável pelo rumo (ou falta dele) das valiosas franchises Star Wars e Marvel…

Mas o filme, apesar de ter tido um número assinalável de visualizações na plataforma de streaming Netflix, com a qual Snyder tem um acordo de exclusividade, foi em última instância um fiasco, tendo sido fortemente criticado por cometer quase todos os pecados que Snyder parece não consegue evitar cometer, especialmente quando ele próprio é não só o realizador, mas também o argumentista e até o director de fotografia para a sua mais recente obra, deixando a ideia de que a Netflix foi excessivamente permissiva em relação à falta de supervisão sobre as decisões do realizador.

A única imposição que aparentemente a Netflix tinha dado era que a versão que iria ser lançada inicialmente para a sua plataforma seria muito mais curta, com cortes significativos em cenas de violência (e sexo), e dividida em duas partes, estreando a segunda parte em Abril deste ano. A isto, como não poderia deixar de ser, Snyder respondeu com a notícia que muitos certamente já esperariam depois da autêntica novela em torno do chamado “Snyder Cut”, confirmando que iria lançar mais tarde uma visão bastante mais longa e que integraria tudo o que foi removido destas versões, dando até um potencial novo significado a Rebel Moon, e mostrando a sua “visão real”.

A muitos, depois desta “novidade” de Snyder, ficaria a dúvida se valeria sequer a pena “perder tempo” a visualizar mais de duas horas de uma versão do filme que o próprio realizador parecia ter deserdado. A mim, que me encontrava entre os críticos daquilo que Snyder nos mostrou há uns meses só ficava a dúvida se esta segunda parte conseguiria corrigir os múltiplos problemas da mesma ou se, incrivelmente, ainda conseguiria agravar os mesmos…

De regresso a Veldt após derrotarem as forças imperiais e celebrando a aparente morte do almirante Noble, os guerreiros reunidos por Kora e Gunnar são informados por Aris, um soldado imperial que agora trabalha com os aldeões, de que não só Noble ainda está vivo, mas as suas forças se dirigem para a aldeia onde chegarão em cinco dias. Sabendo da importância do grão para o Império, um dos novos aliados de Kora, o general Titus, resolve treinar os camponeses para se defenderem dos invasores, ao mesmo tempo que estes aceleram a última colheita para estar completa em três dias, de modo a usar a mesma como escudo em relação aos seus atacantes…

Só pela sinopse já se consegue perceber que só o mais fanático e irracional dos crentes em Zack Snyder poderia defender este filme.

The Scargiver é um desastre que supera as expectativas do mais pessimista dos críticos.

E já que falamos em Scargiver, diga-se que nunca se chega realmente a perceber como é que Kora (cujo verdadeiro nome é Arthelais, embora ela nunca o use, mas sim as forças imperiais quando se referem a ela…) tem esta alcunha em todo o Império, apesar de existir um importante e ABSOLUTAMENTE absurdo flashback que o poderia explicar, ligado ao destino do antigo imperador e que tornou Kora a fugitiva mais procurada no Império.

Em relação ao resto, Snyder mantém teimosamente os pecados usuais e ainda os agrava de modo quase ofensivo. Se o filme tem duas horas, preparem-se porque a primeira hora é a hora mais aborrecida que Snyder alguma vez filmou, com uma longa colheita nos campos de trigo (?) de Veldt em câmara lenta, some-se a isto o treino mais rápido do mundo com os camponeses mais eficientes a aprender de toda a história e feche-se a mesma em beleza com uma inusitada sequência de flashbacks que explica o passado de todo o grupo de modo sequencial numa reunião na véspera da inevitável invasão das forças imperiais.

A segunda metade é igualmente desprovida de lógica, com as forças imperiais a fazerem corar os famosamente ineficientes stormtroopers de Star Wars dada a sua incompetência perante algumas dezenas de aldeões mal armados e com menos de uma semana de treino, mas vale por finalmente ter algumas cenas de acção que sempre dão para entreter o espectador e fazer soltar uma ocasional gargalhada em relação aos incríveis efeitos de plot armor que alguns personagens têm.

Se a primeira parte de Rebel Moon tinha tidos demasiados saltos de planeta em planeta enquanto a equipa maravilha era formada, este The Scargiver decorre quase totalmente em Veldt, na aldeia que não tem nome (Veldt é o nome da lua que dá título ao filme, onde fica a aldeia, incluindo até outra localidade no primeiro filme), e também a bordo da principal nave do Império, o dreadnought King’s Gaze onde, diga-se, os protocolos de segurança deixam muito a desejar.

O elenco tem pouco a salientar, reforçando ainda assim a incapacidade de Sofia Boutella para ser protagonista de um projecto tão ambicioso, parecendo mais talhada para papéis onde as acções falem mais do que a sua falta de expressividade (ou que os diálogos de pobre qualidade que Snyder aqui arquitectou) como a sua vilã em Kingsman: The Secret Service. Já Djimon Hounsou consegue dar um cheirinho de carisma com o seu general Titus, apesar de o personagem urdir um plano que só funcionaria num contexto fantasioso. E mesmo Ed Skrein é muito menos divertido, tanto no bom, como no mau sentido, do que no primeiro filme, parecendo regressar sem grande propósito depois da sua morte aparente no filme anterior e o líder do Império, Balisarius, continua a parecer um horrível erro de casting, mais um no percurso de Snyder, com um actor demasiado jovem (e de vincado sotaque irlandês) como Fra Fee a ser incompreensivelmente caracterizado (de modo pouco convincente) como sendo muito mais velho do que é (e do que deveria ser), isto depois de o actor irlandês também já não ter convencido nada como um dos antagonistas na série Hawkeye.

Se tinham as expectativas baixas como eu, preparem-se porque Zack Snyder conseguirá superá-las, mas pela negativa. Alguém quererá ver as cerca de seis horas que a visão real do realizador terá depois desta debacle? Será um verdadeiro exercício de masoquismo, mesmo com a promessa de sexo e violência.

3/10

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